terça-feira, 17 de abril de 2012

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Desenho qualquer


Risco sobre risco

Não existe maior satisfação, em ver uma obra terminada. A cada risco, abre-se uma porta de inspiração em meu corpo. A cada traço, dado pela inspiração, é perfeitamente elaborado. Cada detalhe, a cada atrito entre lápis e folha. Sentindo um canal de poder que vai do cérebro aos dedos destros. Concentra-se, firmemente. Olhos vidrados. Vai do desenho a inspiração. Vai do chão às nuvens. Concentra-se novamente… risca traços curtos e rápidos… erra, apaga, rápida e cuidadosamente… sente a suavidade, abre um breve sorriso… Verifica a proporção correta, erra, apaga novamente… se pergunta, pensa… começa vagarosamente o risco perdido… sensação de recomeço. Surge uma breve preguiça… vai para o pendente, ajeita nos detalhes mínimos. Volta ao risco perdido. Concentra-se. os olhos brilhando. Longo risco, resenhando com curtos riscos. Tudo medido proporcionalmente a olhos treinados. Sente um prazer imenso, sorri novamente. A sensação de alegria pelo quase término. Sem pressa, passaria horas nesse mundo abstrato, só por essa sensação. Belo, perfeitamente belo. Não a deixa enquanto não terminar… examina os detalhes. Sua boca seca. O que está desenhando? Uma pessoa, um capricho. Nos traços quase terminados, observa os lábios da obra em questão. Entra em leve devaneio, sorri, carinhosamente.  Olha certo tempo para obra. Enfim, terminada. J

Um vulgo amigo, uma tese reconhecida.

Constância Inconstante



O homem é um fio. Com duas extremidades, sem fim nem começo. Talvez, devido ao nosso aprendizado - e o modo como lemos, tendamos a pensar que o homem começa na direita e termina na esquerda. Os árabes o veriam começar pela esquerda e findar pela direita. Eu vejo um fio. Um fio, poeira das estrelas, parado no nada. Isso implica dizer que não se sabe onde começou e nem onde acaba. Só se sabe que ele está lá. Estará lá em si, para si ou por si ?

Temo dizer que ele está por si. Mas como está no nada, receio dizer que está para si. E como o nada é a ausência, ele está em si. Toda consciência é uma consciência de si. O homem parece não ter nenhuma. Se for de si, teria de que preocupar-se com o eterno mal das nossas ruas, vielas, escolas e Poder Público. Mas tudo indica que haver um homem dormindo, passando frio, debaixo de um papelão é motivo de hostilização. Parece ser prazeroso tocar fogo num homem desses e sair correndo enquanto o corpo, em chamas, desfigura-se e torna-se pó. Parece lindo demais espancar idosos incapacitados, doentes mentais, crianças. O homem é sujo, estúpido demais para estar em si. Ele está por si.

O homem construiu os mitos, destruiu-os, restituiu outros. Construiu templos para roubar dinheiro e mandou os pobres aos morros. Voltou-se contra eles, pensando que humanos são palavras e os atos enlatados neles podem ser apagados com corretivo. Entender um erro é pior que resolve-lo. Com seiscentos diabos, quando é que vamos morrer ?

Ainda vejo um fio no nada. A ausência de começo e fim. Ele apenas está lá, cumprindo um papel: o de existir. Vejo-o tão uniforme daqui, mas não sou Deus. Vejo-o com tanta força e sem história pra contar. Será que alguém o criou? Será um animal? Será um anjo caído? Terá levantado os anjos que caíram? Estamos esperando uma solução. Talvez vinda de nós, vinda do que fala alto em nosso consciente febril. Apenas façamos isto: deixemos os mistérios lá. E que a vida siga...


E que a vida siga, porque eu tenho que ir trabalhar e não tenho mais tempo de me olhar no espelho.

(Victor Gaardem)